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sexta-feira, 27 de abril de 2018



O caso Skripal, escape (provisório) para May e Trump

Por Ángel Guerra*

Donald Trump uniu-se à putinofobia de Theresa May com a expulsão de 60 diplomatas russos so solo estadunidense. A maior de representantes de Moscovo desde o começo da guerra fria. Recapitulemos.
A 4 de Março, apareceram inconscientes em Salisbury, Inglaterra, Serguei Skripal, oficial russo dos serviços secretos militares, que se tornou agente inglês, e a filha Yulia, de nacionalidade russa. Condenado na Rússia pelo seu trabalho de espionagem a favor do Reino Unido, o agente saiu da prisão graças a uma troca de espiões e instalou-se em Inglaterra. Os Skripal mostravam graves sintomas de intoxicação e foram conduzidos para um hospital onde permanecem em estado crítico (NT). A 6 de Março, o esgrouviado Boris Johnson, ministro britânico dos Negócios Estrangeiros, deu a entender que Moscovo estava implicado na tentativa de envenenamento dos Skripal e pôs em causa a participação do seu país no mundial de futebol na Rússia. A 12 de Março, a conservadora primeira-ministro May disse ante o parlamento britânico que era “altamente provável” Moscovo ter sido o autor do envenenamento dos Skripal “ com um agente nervoso de natureza militar” do género que a Rússia desenvolve, conhecido como Novichok. May deu um ultimato de dois dias a Moscovo para se explicar e ameaçou adoptar severas medidas se o Kremlin não desse uma respostas satisfatória.
O ministro dos Negócios Estrangeiros russo Serguei Lavrov esclareceria que a Rússia não proporcionou a informação exigida, devido ao facto de não ter obtido nenhuma amostra do agente neurotóxico utilizado contra Skripal. O chefe da diplomacia russa afirmou que, segundo a Convenção sobre Armas Químicas, o Reino Unido devia ter-se dirigido directamente ao país suspeito de haver utilizado a substância, proporcionando-lhe o acesso à mesma.
Duramente censurada no seu próprio partido pela péssima condução do Brexit e em desespero para fugir ao descrédito interno que lhe causou, May viu no envenenamento dos Skripal a mais fácil porta de escape para a crise interna. Não duvidou, por isso, em culpar a Rússia, apesar da Scotland Yard ter dito que a investigação levaria muitos meses e que a Organização para a Proibição das Armas Químicas (OPAC) tardaria três semanas só para identificar o agente neuroparalisante supostamente utilizado contra os Skripal. A primeira-ministra, porém, esperou apenas uma semana para culpar a Rússia do crime e 10 dias para expulsar 35 diplomatas russos do território britânico.
Washington não tardou a anunciar a expulsão dos russos e, atrás, vieram em cascata mais de 24 membros da NATO e da União Europeia, assim como da Austrália. Deverão abandonar os países onde trabalhavam para cima de 120 funcionários do serviço de estrangeiros, no que se chama Ocidente, onde não abundam os países independentes.
Por seu lado, em Washington, o “primeiro ataque com armas químicas na Europa desde a segunda guerra mundial” assentou como uma luva, não importando que nem uma única prova de autoria russa tenha sido apresentada: a Trump, para fugir ao cerco judicial apertado do Procurador Robert Mueller e das crescentes acusações de abuso sexual de várias mulheres; aos fanáticos russófobos como o secretário de Estado Mike Pompeo, o director da segurança nacional John Bolton e um bom número de legisladores republicanos e democratas, porque querem uma política ainda mais hostil contra Moscovo.
Ainda que seja com este circo de mau gosto, o “Ocidente” ripostou aos duros e vitoriosos contragolpes de Vladimir Putin na Geórgia, Ucrânia e Síria, que destronam Washington e Israel como principais decisores no Médio Oriente. E não só. A exibição pelo chefe do Kremlin de armamentos hipersónicos, capazes de neutralizar a instalação contínua de bases da NATO nas suas fronteiras e operar em qualquer parte do mundo, a sua aliança estratégica com a China, a imposição, juntamente com o gigante asiático, de uma política de diálogo na península coreana, o seu arrasador triunfo eleitoral de 18 de Março, tudo isto é demasiado insuportável para o Ocidente.
A Rússia foi declarada livre de armas químicas pela OPAQ. Os Estados-Unidos não. E o alto chefe militar russo Igor Kirilov afirmou que “o laboratório de Porton Down, Inglaterra, continua a ser uma instalação supersecreta, cujas actividades incluem não só destruir armas químicas obsoletas, mas… fazer experiências”. A Rússia negou enfaticamente as acusações. Putin, levar a cabo um ataque destes contra um espião de quarta categoria na véspera das eleições e do mundial de futebol? Por favor!
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*Especialista em questões latino-americanas, analista internacional e colunista do jornal mexicano La Jornada. Comentador da teleSUR. Foi director do jornal Juventud Rebelde (1968-71), da revista Bohemia (1971-80).


NT: o texto original foi publicado em 29 de Março de 2018 e pode ser lido aqui. Entretanto, os Skripal continuam vivos, graças a Deus!

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