O QUE ELES ESCONDEM

quarta-feira, 21 de maio de 2014



 


OS PERIGOS DO TRATADO TRANSATLÂNTICO
Por Gaël De Santis*

O projecto escondido pelos dirigentes europeus e americanos antes das eleições.

Se não nos acautelarmos, a mão invisível do mercado, que tantos estragos fez na União Europeia (UE), poderá executar o seu trabalho sujo a uma escala ainda maior.
Neste preciso momento em que os aspirantes a deputados europeus se encontram em campanha, está a ser negociada uma parceria transatlântica de comércio e investimento (TTIP), mais conhecida por grande mercado transatlântico.

Ainda pode ser travado. Os parlamentares, saídos do escrutínio de 25 de Maio, terão de validar ou rejeitar este projecto, quando as negociações estiverem concluídas. Os 28 Estados terão, igualmente, que se pronunciar.
Se entrasse em vigor, o TTIP teria efeitos nefastos sobre a economia, mas, também, sobre os direitos dos trabalhadores europeus e estado-unidenses, expostos às arbitrariedades dos ventos da concorrência livre e não falseada. Do lado europeu, os promotores do projecto não procuram outra coisa senão testar, numa escala maior, o que já falhou. As negociações mantêm-se à porta fechada entre as equipas do comissário Karel De Gucht, pela UE, e do representante para o Comércio, Michael Froman, pelos Estados Unidos.

A próxima reunião terá lugar dia 19 de Maio, a seis dias das eleições europeias, sem que os cidadãos sejam informados sobre o estado actual das negociações. O objectivo da Comissão é o de criar a maior zona de livre comércio do mundo, que pesará 30% do comércio mundial. Isto teria duas vantagens: dar uma ajudinha de 0,5% do PIB à economia europeia, daqui a 2027, e fazer baixar os preços. É o que defende um estudo oficial, publicado, em Setembro, pela Comissão. Outras avaliações são menos encomiásticas, como a da Fundação Austríaca para a Investigação e Desenvolvimento, que avalia estes ganhos limitados e que pesarão nas contas públicas: a diminuição dos direitos alfandegários acarretarão uma perda de 20 biliões de euros para o orçamento europeu, durante os próximos 10 anos e os Estados terão de encontrar 1,4 biliões de euros, por ano, para fazer face às despesas com o desemprego. Com efeito, entre 430.000 e 1,1 milhão de pessoas terão de mudar de emprego, como resultado das reestreuturações necessárias.
Mas, o pior não está aí.

O mandato de negociação, adoptado pelos ministros do Comércio, em 14 de Junho último, contém perspectivas de evolução destrutivas do modelo social europeu. A soberania dos Estados é atacada pela perspectiva da criação de um “mecanismo de regulação dos diferendos” entre investidores e Estados. Os litígios entre os dois poderiam ser resolvidos em tribunais privados.
O objectivo é afastar qualquer obstáculo à mão livre do mercado. Por consequência, os direitos alfandegários serão fortemente reduzidos. Eles são já baixos, argumentam os defensores do tratado. A UE cobra, hoje, 3,3% sobre as importações provenientes dos Estados Unidos. Mas, alguns sectores, onde os direitos alfandegários são ainda elevados (carne, produtos agrícolas), poderiam ter que enfrentar uma concorrência desenfreada dos produtores americanos, originando uma forte volatilidade nos preços dos géneros alimentares.

Dos dois lados do Atlântico, querem derrubar as “barreiras não tarifárias”, isto é, as diferenças de normas sanitárias ou de segurança. Ora, quanto a isto, entre os Estados Unidos e a Europa, as concepções e culturas são diferentes. Lá, explora-se o gás de xisto de qualquer maneira, mergulha-se os frangos em água com cloro e não se refila por ingerir cereais OGM. Para que haja normas comuns, cada um terá de dar um passo na direcção do outro.
Esta harmonização das normas oferece um segundo perigo – o geopolítico. A nova parceria pesará 54% do PIB mundial e metade do consumo do planeta. As normas transatlânticas impor-se-ão ao resto do mundo. Isto permitiria ao Tio Sam prolongar, durante mais algum tempo, a sua hegemonia declinante e fazer frente à progressão rápida dos países emergentes. ´

O presidente Barack Obama só tem olhos para José Manuel Barroso, presidente da Comissão, que convenceu os Estados europeus a entrar neste negócio de vigaristas. Obama e o seu Secretário John Kerry multiplicam as idas e vindas ao sudeste asiático, para contrabalançar, aí, a influência da China e instalar uma parceria dos dois lados do Pacífico, semelhante ao futuro tratado transatlântico.
Por detrás deste projecto, prepara-se uma NATO económica, contra a qual está já a levantar-se uma ampla coligação de organizações sindicais, cidadãs, políticas, dos dois lados do Atlântico. Tanto para os militantes estado-unidenses, como europeus “é importante mostrar que não são eles contra nós, mas que temos interesses comuns”, previne Hélène Cabioc’h, da rede Aitec.

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* Jornalista

O original encontra-se em http://www.humanite.fr/telecharger-lhumanite-speciale-revelations-des-dangers-du-traite-transatlantique-528708

 
TRIBUNAIS ARBITRAIS: AS MULTINACIONAIS FORA DA LEI
Por Gaël De Santis
 
O principal perigo deste tratado é a instauração de uma justiça privada, que poderia impedir, a pedido das grandes empresas, os Estados de definir as suas prioridades políticas.

Como ficar de mãos atadas? Perguntem aos ministros do Comércio da União Europeia (UE) que, no dia 14 de Junho de 2013, redigiram o mandato de negociação da Comissão com vista a um tratado de livre comércio com os Estados Unidos. Eles aceitaram, sob pressão dos Estados Unidos, encetar conversações sobre um mecanismo de regulação de diferendos.
Por detrás deste termo pomposo e misterioso, esconde-se uma verdadeira máquina de guerra contra a soberania dos Estados. De que se trata? Quando uma multinacional julgar que a decisão de um governo é um entrave à sua “liberdade de investir”, pode apresentar queixa. Perante quem? Não será perante a justiça desse Estado, a quem é retirada a soberania judicial. O dito Estado será levado perante um tribunal arbitral internacional.

Estes tribunais não são outra coisa que empresas privadas, encarregadas de ditar as leis. Ora, estas leis privilegiam o livre comércio face às leis emanadas dos Parlamentos. É “um risco injustificado contra a capacidade de decisão política a nível local” e nacional – inquieta-se a Federação dos Sindicatos estado-unidenses (AFL-CIO).
A ameaça não é um fantasma. Ela é concreta e está já a causr prejuízos em muitas partes do mundo. Se um Estado quiser prevenir o tabagismo, alto lá! O gigante Philip Morris está atento: apresentou queixa nos tribunais arbitrais, contra o Uruguai e a Austrália, com base em disposições inscritas nos acordos de livre comércio entre estes países e os Estados Unidos. Os dois países tiveram a infeliz ideia de inscrever, obrigatoriamente, mensagens de prevenção... Por seu lado, a companhia estado-unidense Lone Pine persegue em tribunal o Quebeque, que decidiu fazer uma moratória sobre a fracturação hidráulica, tecnologia que permite extrair gás de xisto de maneira poluente [1].

Como se vê, estes procedimentos, através dos quais as firmas multinacionais pedem indemnizações recorde, são verdadeiras armas anti-regulação. Com efeito, mesmo quando o processo não lhes é favorável, a insegurança jurídica permanece e pode revelar-se dissuasiva para os Estados.
Por vezes, são as políticas sociais as atacadas. Assim, a Eslováquia foi condenada, por um tribunal arbitral, a pagar 22 milhões de euros à empresa holandesa Achmea, com base no tratado bilateral de investimento entre Bratislava e Amsterdão. Em 2006, a esquerda, de regresso ao poder, decidiu exigir às seguradoras de saúde que não distribuíssem mais dividendos. Para que conste, a Eslováquia, recusando conformar-se com a decisão do tribunal, viu, o ano passado, alguns dos seus bens serem confiscados, no Luxemburgo, alardeia a seguradora holandesa no seu site da internet.

As escolhas industriais dos países são, igualmente, contestadas. É o que se passa na Alemanha, que decidiu virar a página do nuclear. A empresa Vattenfall sueca acaba de pedir 3,7 mil milhões de euros de compensação.

Pseudo-consulta pública
Por fim, é a capacidade dos países em anular uma parte da sua dívida que é ameaçada. A Argentina foi alvo de um processo. E a Grécia está a sofrer o mesmo, neste momento. Um banco da Eslováquia, Postava, e investidores cipriotas, em nome de um acordo de investimento entre estes países, exigem ser reembolsados pelos títulos do Tesouro que foram anulados, em 2012, no seguimento de um acordo internacional com o Fundo Monetário Internacional e a União Europeia. O dossier é explosivo e a Comissão sabe. Por isso, suspendeu as negociações neste capítulo do acordo transatlântico, em Janeiro, e lançou uma pseudo-consulta pública sobre o assunto... que lhe permitirá retomar as negociações logo após as eleições europeias.

Antes da redacção do mandato de negociação, em 14 de Junho, o Parlamento francês havia exigido, explicitamente, uma resolução em “que seja excluído o mandato de recurso a um mecanismo específico de regulação dos diferendos”. Estes mecanismos farão a fortuna dos escritórios de advogados especializados e, também, das empresas encarregadas de fazer a lei.
No fim do ano passado, o Centro Internacional para a Regulação de Diferendos relativos aos investimentos (CIRDI) tinha registado 459 queixas, desde 1972. Este número está a aumentar. Não eram mais que 3 por ano, em 1996. Foram 50, em 2012 e 40, em 2013.

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[1] A fracturação hidráulica consiste em injectar, sob forte pressão, uma mistura de água, produtos químicos e areia a fim de partir a rocha e provocar a libertação dos hidrocarbonetos. Este tipo de exploração de gás e petróleo implica a perfuração de numerosos poços, já que a capacidade se esgota numa dezena de anos. Requere, ainda, um grande consumo de água e provoca a descarga de grande quantidade de resíduos líquidos tóxicos, bem como de um gás com efeito de estufa, o metano. [NT]

O original encontra-se em http://www.humanite.fr/telecharger-lhumanite-speciale-revelations-des-dangers-du-traite-transatlantique-528708


 

terça-feira, 20 de maio de 2014


O Patético Neoliberalismo da Comissão Europeia

Por Vicenç Navarro*

Um dos personagens mais patéticos (e não há outra forma de o definir), no cenário político europeu, é Olli Rehn (a partir de agora, OR), Comissário dos Assuntos Económicos e Monetários da União Europeia e porta-voz máximo do neoliberalismo, na Comissão Europeia. Reproduz, acriticamente, as suas receitas, que levaram a Espanha ao desastre e continua, hoje ainda, a insistir na necessidade das políticas de austeridade, afirmando que estão a dar frutos, pois a Espanha está a sair da crise. Esta posição é amplamente partilhada pela Troika (FMI, Comissão Europeia e Banco Central Europeu), mesmo quando o FMI parece distanciar-se de dita posição. Mas OR é um dos dogmáticos da fé neoliberal, totalmente impermeável à evidência presente dos dados, que não confirmam o seu credo.
Foram três as políticas públicas que OR mais promoveu para Espanha. Uma é a da redução e eliminação do défice público, pois a Espanha, segundo ele, deve comportar-se como uma família, que não pode gastar mais do que o que tem, apresentando o défice público como causa da crise. O que é extraordinário é que este personagem (assim como muitos dos analistas económicos defensores deste dogma, amplamente promovidos nos media, tanto na Catalunha, como no resto da Espanha) esteja, constantemente, a sublinhar que o elevado défice público espanhol é a causa da crise económica actual, em Espanha. A não ser que o défice público baixe e seja eliminado, a Espanha – segundo OR – não sairá da grande depressão (em Espanha, falar de recessão é, claramente, insuficiente para definir a situação económica). E os jornalistas que o entrevistam tomam nota e publicam esta explicação da crise, sem nunca fazer, ao Senhor OR, a pergunta óbvia: dado que Espanha tinha um superávit e não um défice quando a crise se iniciou, como pode o Senhor dizer que a causa da crise é o défice público, quando a Espanha estava com superávit? O facto de os jornalistas não lhe fazerem esta pergunta, tão óbvia, é sinal de que os jornalistas deste país parecem não entender os indicadores económicos.

Na realidade, todos os dados mostram que foi a crise que criou o défice público e não o contrário. O enorme desemprego, criado, em parte, pelas políticas de austeridade e cortes na despesa pública, foi o que criou um abrandamento da procura e do crescimento económico, causa da dramática redução das receitas do Estado (consequência de que a grande maioria dos impostos, em Espanha, se baseia nos rendimentos do trabalho e muito pouco nos do capital). Foi isso que fez disparar o défice público. A combinação de cortes na despesa pública com a redução das receitas do Estado, resultado, entre outros factores, do desemprego (26% da população activa), foi o que causou o disparar do défice público. Os dados que apoiam esta interpretação estão aí para quem quiser ver. Dizer, como OR continua a dizer, que o elevado défice público foi o que causou a crise é mais do que uma frivolidade. É uma falsidade, que não pode ser atribuída à ignorância. Mas, o que é igualmente censurável é o silêncio dos media, resultado da sua enorme docilidade para com o poder.

O apóstolo do austericídio: o comissário Olli Rehn
O outro erro (que, de novo, poderia definir-se como falsidade) é a afirmação de que o Estado é como uma família, que toda a gente sabe que não pode gastar mais do que recebe. OR sublinha isto, continuamente, e fica com a mesma cara. O diário digital “Nada es gratis”, de Fedea, a plataforma do grande capital, cuja ideologia é o neoliberalismo, repete também, constantemente, esta frase. Pelos vistos, a família Rehn deve ser multimilionária e compra tudo a pronto (seja uma casa ou um carro). Mas, a maioria das famílias endivida-se, isto é, a economia familiar funciona com basa no crédito. E o mesmo se passa com os Estados, que têm de pedir dinheiro emprestado para educar os nossos filhos e netos, para investir em infraestruturas, que também os beneficiarão e um longo etc.

Mas há um outro problema na homologação das famílias com os Estados, que, pelos vistos, OR desconhece. O Estado pode ter o que uma família não pode ter. Quer dizer, pode ter um banco central, que imprima dinheiro e ajude a que os juros que tem de pagar pelos seus títulos de dívida pública não sejam mais elevados do que aquilo que o Estado pode pagar. Os bancos centrais podem comprar dívida pública e, com isso, forçar os juros a baixar. As famílias não têm esta possibilidade. Mas, o que OR parece desconhecer é que, na UE, os Estados nem sequer têm bancos centrais que os possam ajudar. E aí está o problema, que os Estados são muito vulneráveis à especulação dos mercados financeiros, pois não estão protegidos pelo Banco Central Europeu, que, como já disse muitas vezes, não é um banco central, mas um lobby da banca. Daí que a Espanha tenha tido que pagar uma quantia elevadíssima de juros para obter dinheiro da banca privada. E o Sr. OR foi um dos que apoiaram este sistema. E, agora, tem a ousadia de dizer que o Estado tem uma dívida pública demasiado elevada e um défice público demasiado elevado e que daí surja o problema de não poder conseguir empréstimos a juros razoáveis, pois os famosos mercados financeiros não confiam nos Estados.
A nula credibilidade desta posição apareceu claramente quando o Sr. Draghi, com uma só frase (indicando que compraria dívida pública), provocou uma descida dos juros que o Estado espanhol pagava, de forma automática e significativa. Se o BCE tivesse dito e feito isto, inicialmente, a recessão não teria ocorrido como ocorreu. Isto é, novamente, óbvio. Mas, os jornalistas nunca lhe fizeram esta observação.

A cumplicidade dos media com o austericídio
Outra frivolidade deste personagem é a sua outra proposta para sair da crise: a redução dos salários para tornar a economia mais competitiva. Outro dogma neoliberal. É interessante que o Sr. OR nunca (repito, nunca) tenha sugerido baixar os lucros empresariais (pois, segundo os livros de economia, os lucros fazem parte, também, dos custos de produção e, portanto, os preços poderiam, igualmente, baixar, mediante a redução dos lucros). Na realidade, à medida que os salários têm descido, os lucros têm aumentado. Então, por que não reduzir os lucros? Isso não está no cenário do Sr. OR. Quando fala de sacrifícios, supõe-se que só os trabalhadores têm de os fazer. O que OR deseja é ir baixando os salários, para que os países da UE compitam entre si, a ver quem os baixa mais, numa dinâmica que nos levará ao nível do Bangladeche. Esta descida de salários, juntamente com os cortes, está a criar-nos um problema enorme de falta de procura. Mas isto é demasiado complicado para o entendimento de OR.

Estas políticas, que OR está a impor, foram definidas, com razão, como um austericídio. A única interpretação para a insistência é, ou o seu dogmatismo, impermeável à evidência empírica, ou uma extraordinária incompetência, o que não excluo. Conheço bem como funciona cada uma das instituições da Troika (tenho pessoas conhecidas que trabalham nelas e, pela minha profissão, tenho de ler os seus documentos) e é surpreendente a insuficiência de conhecimentos, quando não mera incompetência. Um caso muito claro desta incompetência é a afirmação que fez, em Dezembro de 2013, dizendo que a Espanha estava, já, a sair da crise. Três semanas mais tarde, em 23 de Janeiro de 2014, anunciava-se que o desemprego havia aumentado, chegando ao nível máximo alcançado até então. O mesmo está, agora, a acontecer. E o Sr. OR, muito tranquilo, dando entrevistas, sem que nenhum jornalista lhe apresente os dados, que põem em causa os seus dogmas. Na realidade, tal personagem não poderia manter qualquer credibilidade, se não fosse a docilidade dos grandes media, controlados pelo grande capital. Claro como água.
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* Catedrático de Ciências Políticas e Sociais, na Universidade Pompeu Fabra, de Barcelona. Foi Catedrático de Economia Aplicada, na Universidade de Barcelona. É também professor de Políticas Públicas na The Johns Hopkins University (Baltimore, EUA), onde foi docente durante 35 anos. Dirige o programa Políticas Públicas e Sociais, patrocinado conjuntamente pela Universidade Pompeu Fabra e The Johns Hopkins University. Dirige, igualmente, o Observatório Social de Espanha.

 

 

 

domingo, 18 de maio de 2014


O dia da "saída" da troika
O que o governo quer comemorar em 17/Maio/2014
– Recordar que há três anos os portugueses estavam melhor do que agora
– É necessário por rapidamente um travão à destruição do país
por Eugénio Rosa [*]
A direita e os seus defensores nos media procuram fazer passar junto da opinião pública a mensagem de que os três últimos anos de "troika" e de governo PSD/CDS foram um êxito. Paulo Portas fala mesmo de "dever cumprido" . Numa sessão especial de conselho de ministros aberta, com a presença de todos os ministros e secretários de Estado "o primeiro-ministro, o secretário de Estado adjunto do primeiro-ministro Carlos Moedas, a ministra das Finanças, e o vice-primeiro-ministro não se cansaram de repetir a ideia de um Portugal que ultrapassou com sucesso a difícil prova da troika e de tecer auto-elogios", como noticiaram os órgãos de comunicação. E, sem vergonha pelas centenas de milhares de portugueses cuja vida destruíram, vão procurar comemorar com "pompa e circunstância" o 17 de Maio de 2014. Portanto, é necessário confrontar esse discurso laudatório e monolítico que certamente dominará os media nesse dia com os dados objetivos sobre a situação do país. É o que vamos procurar fazer neste estudo para reflexão do leitor, utilizando apenas dados oficiais.

SEM MEDIDAS EXTRAORDINÁRIAS QUE O GOVERNO DIZ SEREM TEMPORÁRIAS O DÉFICE ORÇAMENTAL SERIA EM 2014 DE 8,4% E NÃO O DÉFICE OFICIAL DE 4% DO PIB

Um dos êxitos mais badalados na propaganda da direita, e pelos seus defensores nos media, é a redução do défice orçamental que foi conseguida nestes três anos de "troika" e de governo PSD/CDS que, entre 2010 e 2014, passará de 9,8% para 4% do PIB. Pondo de lado as sucessivas alterações no chamado "Memorando" assinado pela "troika" e pelo PS, PSD e CDS, que foram feitas no segredo dos gabinetes pelo governo e pela "troika" ao longo destes três anos à margem da Assembleia da República e dos portugueses, interessa recordar, para desconstruir este mito da propaganda da direita, alguns factos. Para isso peguemos no objetivo para 2014, que é um défice orçamental de 4%. Como é que ele é conseguido? Fundamentalmente por meio de um corte nos salários dos trabalhadores da Função Pública que soma 1.200 milhões €; por meio novamente do congelamento de salários e pensões que soma 968 milhões €; através da chamada Contribuição Extraordinária de Solidariedade (CES) que faz mais um corte nos rendimentos dos pensionistas estimado em 660 milhões €; e, finalmente, pela manutenção de um enorme aumento de impostos que, entre 2012 e 2014, atinge 4.613 milhões €. Somando todos estes valores (1.200M€+968M€+660M€+4.613M€) obtém-se 7.441 milhões €, o que corresponde a 4,4% do PIB. Somando este valor aos 4% previstos pelo governo, obtém-se um défice orçamental real de 8,4% (14.192 milhões €), portanto é este o valor a que se chega eliminado o efeito das medidas extraordinárias que o governo afirma, para enganar os portugueses, que são temporárias mas que, se se mantiver em funções, certamente as transformará em permanentes. Eis a realidade que os media afetos ao governo sistematicamente escondem, apresentando-a como o êxito.

OS CORTES NA DESPESA E AUMENTOS DE IMPOSTOS SUCESSIVOS, MUITOS DELES ADICIONADOS AOS ANTERIORES, ATINGIRAM 28.247 MILHÕES €

O quadro 1, construído com dados constantes dos Relatórios do Orçamento de Estado dos anos 2011 a 2014, dá uma ideia dos cortes de despesa pública e dos aumentos de impostos, que o governo diz que são, na sua maioria, extraordinários e temporários, com os quais foi conseguida a redução do défice tão badalado na propaganda oficial e nos media.

Quadro 1- Cortes na despesa pública e aumentos de impostos, que se adicionam em cada ano aos feitos no ano anterior, pela "troika" e governo PSD/CDS
Ano
Corte na despesa pública
Milhões €
Redução da despesa devido ao congelamento de salários e pensões
Milhões €
Receita obtida com o aumento de impostos
Milhões €
Total
Milhões €
2011
3.764,8
968,0
2.053,5
6.786,3
2012
5.329,3
968,0
3.711,4
10.008,7
2013
1.025,6
968,0
4.312,4
6.306,0
2014
3.184,0
968,0
994,0
5.146,0
Total
13.303,7
3.872,0
11.071,3
28.247,0
Fonte: Relatórios do Orçamento de Estado 2011, 2012, 2013 e 2014.
Os dados do quadro 1 não dão de uma forma instantânea a dimensão dos cortes de despesa pública nem do aumento de impostos verificados nos anos de "troika". Para ficar com uma ideia correta é preciso ter presente que, muitos deles, se adicionaram aos dos anos anteriores. Mesmo assim, o valor total – 28.247 milhões € - não deixa de ser chocante pois eles foram subtraídos aos rendimentos dos portugueses numa altura em que a esmagadora maioria das famílias portuguesas faz imensos sacrifícios para sobreviver.

APESAR DOS SACRIFÍCIOS IMPOSTOS AOS PORTUGUESES OS DÉFICES ORÇAMENTAIS ACUMULADOS DURANTE A TROIKA ULTRAPASSARAM OS 34.600 MILHÕES €

O quadro 2, construído com dados oficiais, mostra uma outra faceta das consequências da política da "troika" e do governo PSD/CDS que é também escondida pela propaganda oficial

Quadro 2 – Défices orçamentais e juros pagos durante o período da "troika"
Anos
Défice orçamental
Milhões €
Juros pagos aos credores
Milhões €
2011
7.432,9
6.890,0
2012
10.641,9
7.126,0
2013
9.778,1
7.188,8
2014
6.793,3
7.324,0
Soma
34.646,2
28.528,8
Fonte: Relatórios do Orçamento de Estado, 2011-2014
Apesar dos imensos sacrifícios feitos pelos portugueses, que sofreram um corte brutal nos seus já baixos rendimentos, o governo acumulou défices orçamentais em quatro anos de troika que atingem 34.646,2 milhões € (corresponde a 16,9% do valor do PIB previsto para 2014) que foram engrossar a divida pública e que terão de ser pagos também pelos portugueses. O valor obtido com o corte na despesa pública e com o aumento de impostos (28.247 milhões €) não foi para pagar a divida, mas sim entregue aos credores (UE, FMI, grandes grupos financeiros), sob a forma de pagamentos de juros que, somados, atingiram 28.528,8 milhões € como mostra o quadro 2.

A REDUÇÃO BRUTAL DAS REMUNERAÇÕES DOS TRABALHADORES DA FUNÇÃO PÚBLICA E A DESTRUIÇÃO DE SERVIÇOS PÚBLICOS ESSENCIAIS À POPULAÇÃO

O quadro 3, também construído com dados oficiais, mostra de uma forma quantificada e objetiva, uma outra consequência da politica de destruição da troika e do governo PSD/CDS.

Quadro 3- Corte brutal na despesa com trabalhadores da Função Pública e no investimento público
Anos
PIB
Milhões €
Receita Fiscal APs
Milhões €
Receita Fiscal
% do PIB
Despesa com pessoal APs
Milhões €
Despesa com pessoal APs
% do PIB
FBCF
Milhões €
FBCF
% do PIB
2010
172.859
38.262
22,1%
21.157
12,2%
5.195
3,0%
2011
171.126
39.540
23,1%
19.422
11,3%
4.010
2,3%
2012
165.107
37.626
22,8%
16.510
10,0%
2.745
1,7%
2013
165.666
41.045
24,8%
17.789
10,7%
2.376
1,4%
2014
168.955
42.239
25,0%
16.389
9,7%
3.041
1,8%
2014-10
3.977
+2,9 p.p.
-4.768
-2,5 p.p.
-2.154
-1,2 p.p.
Variação 2010-14
10,4%
12,9%
-22,5%
-20,7%
-41,5%
-40,1%
Fonte: Análise da Conta das Administrações Públicas 2013-Abril 2014, Conselho das Finanças Públicas: DEO 2014-2018 do governo
Entre 2010 e 2014, ou seja, com a "troika" e com o governo PSD/CDS, os impostos aumentaram em quase 4.000 milhões € (em % do PIB, subiu de 22,1% para 25%; o INE refere 25,6% em 2013), mas as despesas com os trabalhadores da Função Pública sofreram um corte de 4.768 milhões € (passam de 12,2% para apenas 9,7% do PIB, um valor inferior à média dos países da UE que ronda 11%), o que provocou uma forte degradação dos serviços públicos essenciais prestados à população agravando ainda mais suas condições de vida. E o investimento público, que já era diminuto, sofreu um corte de 40,1%, o que contribuiu para o agravamento da crise económica e social cuja consequência mais visível é o disparar do desemprego. Eis uma outra consequência da ação da "troika" e do governo PSD/CDS, que este e os seus defensores nos media certamente procurarão esconder.

APESAR DE TANTOS SACRIFÍCIOS IMPOSTOS AOS PORTUGUESES E DA VENDA A SALDO DE EMPRESAS PÚBLICAS A DIVIDA PÚBLICA DISPAROU NOS ANOS DE " TROIKA

Uma das justificações para a intervenção da " troika " em Portugal e de toda esta politica recessiva e destrutiva do governo PSD/CDS era conter o aumento do endividamento público, o interno e o externo do país. O que aconteceu nestes anos de "troika" foi precisamente o contrario como mostram os dados do Banco de Portugal constantes do quadro 4.

Quadro 4- A variação do endividamento no período da "troika"
Rubricas
Mar 2011
Milhões €
Dez 2013
Milhões €
Variação
Milhões €
Variação
%
Fev 2014
Milhões €
DÍVIDA DAS ADMINISTRAÇÕES PÚBLICAS
188.681
252.914
64.233
34,0%
258.391
Dívida na ótica de Maastricht
163.356
213.631
50.275
30,8%
220.591
% do PIB
Em 2010: 94%
129%
 
 
 
DÍVIDAS DAS EMPRESAS PÚBLICAS
44.456
44.886
430
1,0%
44.746
DÍVIDAS DAS EMPRESAS PRIVADAS
305.830
306.973
1.143
0,4%
306.644
PME (366 mil empresas)
187.830
165.251
-22.579
-12,0%
 
Grandes empresas (1000 empresas)
71.741
89.021
17.280
24,1%
 
Sociedades gestoras de Participações Sociais, Grupos económicos (3000 empresas)
46.287
52.701
6.414
13,9%
 
DÍVIDAS DOS PARTICULARES (Famílias)
178.610
159.918
-18.692
-10,5%
158.852
POSIÇÃO DO INVESTIMENTO INTERNACIONAL (saldo devedor do país ao estrangeiro)
184.008
196.642
12.634
6,9%
 
EMPREGO (milhares)
4.866
4561,5
-305
-6,3%
 
Número de trabalhadores com salários declarados à Segurança Social (milhares)
3.222
2.941
-281
-8,7%
2.906
DESEMPREGO OFICIAL (milhares)
689
827
138
20,0%
 
Fonte: Banco de Portugal, Boletins Estatísticos, Junho 2012 a Abril 2014
Em praticamente três anos de "troika" e de governo PSD/CDS, a divida das Administrações Públicas aumentou em 69.710 milhões €, pois passou de 188.681 milhões € para 258.391 milhões €, ou seja, em média 23.236 milhões € por ano. (com Sócrates aumentou, em média, 10.000 milhões € por ano). Mesmo na ótica de Maastritch, que não inclui toda a divida das Administrações Públicas, a divida pública aumentou 57.235 milhões, ou seja, em média 19.078 milhões € por ano. E isto apesar da venda a saldo de empresas e participações públicas no valor de 8.500 milhões €. É uma herança pesada que os portugueses não têm razões para festejar.

O AUMENTO DA MISÉRIA E A CONCENTRAÇÃO DA RIQUEZA NUMA MINORIA

Nestes anos de "troika" e de governo PSD/CDS, a pobreza aumentou assim como a concentração da riqueza, como dados do INE do quadro 5 mostram.

Quadro 5- Aumento da pobreza e concentração da riqueza durante a "troika"
Ano de referência dos dados
2009
2010
2011
2012 (Po)
2012
Milhares de portugueses
Taxa de risco de pobreza (60% da mediana)
Em percentagem
 
Antes de qualquer transferência social
43,4
42,5
45,4
46,9
4.918,5
Após transferências relativas a pensões
26,4
25,4
25,3
25,6
2.684,7
Após transferências sociais
17,9
18,0
17,9
18,7
1.961,1
Indicadores de desigualdade de rendimento
Desigualdade na distribuição de rendimentos (S80/S20)
5,6
5,7
5,8
6,0
 
Desigualdade na distribuição de rendimentos (S90/S10)
9,2
9,4
10,0
10,7
 
EU-SILC
2010
2011
2012
2013 (Po)
 
Fonte: INE, Inquérito às condições de vida e de rendimento: 2013
A pobreza nos anos de troika não parou de crescer em Portugal. No fim de 2012, 4,9 milhões de portugueses estariam no limiar da pobreza se não fossem as pensões e outras prestações sociais, tendo este número aumentado em meio milhão entre 2010 e 2012. Mesmo após todas as transferências sociais (pensões e outras prestações), mais de 1,9 milhões de portugueses continuavam a viver no limiar de pobreza em 2012. Enquanto a pobreza se generalizava em Portugal para que os credores pudessem receber juros leoninos e o "seu" capital, os ricos ficaram mais ricos com a "troika" e com o governo PSD/CDS. Por ex., o décimo mais rico da população viu o número de vezes que o seu rendimento é maior do que os 10% mais pobres aumentar de 9,4 vezes para 10,7 vezes entre 2010 e 2012. Portugal transformou-se com a "troika" e com o governo PSD/CDS num país cada vez mais bipolarizado, em que uma maioria tem cada vez menos para viver, e uma minoria apropria-se de uma parte cada vez maior da riqueza criada no país. É a vitória disto que a direita quer comemorar no 17 de Maio. A tudo isto há ainda a acrescentar a generalização do trabalho gratuito na Administração Pública, o corte de salários e pensões, o corte do pagamento do trabalho extraordinário para metade, o embaratecimento dos despedimentos e, mais recentemente, a caducidade prematura dos CCT para baixar os salários futuros.

O RETROCESSO DA PROCURA INTERNA, NO INVESTIMENTO E DA RIQUEZA CRIADA EM PORTUGAL DURANTE A TROIKA QUE FEZ O PAÍS REGREDIR VÁRIOS ANOS

Os dados do INE constantes do quadro 6 mostram, de uma forma clara, o retrocesso em anos, em várias áreas fundamentais, para os portugueses.

Quadro 6 – Retrocesso no consumo, no investimento, na procura interna, e na riqueza criada no país
ANOS
Despesas de consumo final
Milhões €
Formação bruta de capital
Milhões €
Procura interna
Milhões €
PIB a preços de mercado
Milhões €
2010
143.824,2
33.232,4
177.056,6
162.953,2
2011
138.513,7
29.527,7
168.041,4
160.915,5
2012
131.320,5
25.563,3
156.883,8
155.717,0
2013
129.130,9
23.697,0
152.827,9
153.609,5
2010-2013
-10,2%
-28,7%
-13,7%
-5,7%
2010-2013
-14.693,3
-9.535,4
-24.228,7
-9.343,7
Fonte: INE, CNAP-2013
Entre 2010 e 2013, portanto durante o período da "troika", registaram-se retrocessos significativos (equivalentes a vários anos) em áreas fundamentais para o desenvolvimento do país, como são procura interna (-13,7%), o investimento (-28,7%) e a criação de riqueza (-5,7%), e para o bem estar da população como é o consumo (-10,2%). O próprio DEO: 2014-2018 reconhece que serão necessários vários anos para o país alcançar o nível que tinha antes da "troika" e do governo PSD/CDS. Efetivamente, com taxas de crescimento da economia que variam entre 1,5% em 2015 e 1,8% em 2018, com o aumento de consumo privado que varia entre 0,7% e 0,8%, e de consumo público -1,6% e -0,1% entre 2015 e 2018; e com taxas de crescimento do investimento que variam entre 3,8% em 2015 e 4,3% em 2017, é fácil de concluir que o país levaria muitos anos a recuperar da hecatombe que foram a troika e o governo PSD/CDS. Mas é isto também o que a direita pretende comemorar no dia 17 de Maio de 2014.

OS MITOS DA DIREITA SOBRE O CRESCIMENTO ECONÓMICO, E A "TROIKA" CONTINUA EM PORTUGAL SOB A DESIGNAÇÃO DE "PACTO ORÇAMENTAL" E GOVERNO PSD/CDS

Um dos mitos construído pela direita, pela "troika" e pelo pensamento económico único dominante nos média é que era possível a recuperação e o crescimento económico em Portugal com base nas exportações, e destruindo o poder de compra da população. A realidade veio desmentir tal teoria. Mesmo a recuperação anémica da economia que se verificou nos últimos dois trimestres só foi possível com reanimação, embora muito pequena, da procura interna. Enquanto a economia assentava no aumento das exportações, ela não parou de se afundar. Para além disso, e como já tínhamos advertido, qualquer pequena reanimação da economia determinaria o disparar das importações, até porque milhares de empresas foram destruídas pela ação da "troika" e do governo PSD/CDS. Os últimos dados do INE, já referentes a 2014, confirmam e reforçam tal conclusão.

Segundo o INE, no 1º Trim.2014, as exportações (11.734,3 milhões €) aumentaram apenas 1,7%, enquanto as importações (14.333 milhões €) cresceram 6%. E também segundo o INE, "O Produto Interno Bruto (PIB) registou, em termos homólogos, um aumento de 1,2% em volume no 1º trimestre de 2014, após a variação de 1,5% (queda) observada no 4º trimestre de 2013. A procura externa líquida (exportações – importações) apresentou um contributo negativo expressivo para a variação homóloga do PIB no 1º trimestre, depois de registar um contributo positivo no trimestre precedente, devido principalmente ao abrandamento das Exportações de Bens e Serviços, tendo as Importações de Bens e Serviços acelerado. A procura interna apresentou um contributo positivo mais significativo no 1º trimestre, refletindo sobretudo a evolução do Investimento. Maior desmentido por uma entidade oficial não podia ser feito ao mito da direita e de muitos comentadores com acesso fácil aos media. É neste contexto que o Pacto Orçamental da UE ao impor, para além do período da "troika", a redução drástica do défice orçamental e da divida pública, num curto período de tempo, o que pressupõe a continuação da austeridade violenta, através da manutenção de enormes aumentos de impostos e de cortes significativos na despesa pública, constitui uma forte ameaça a qualquer recuperação sustentada da economia e ao desenvolvimento do país como está já a acontecer, o que é confirmado pelos indicadores negativos divulgados pelo INE.. A manter-se tal situação Portugal não tem qualquer futuro dentro da zona do euro. É também isto que uma direita sem sentido e dignidade nacional pretende comemorar no 17 de Maio de 2014.
16/Maio/2014
 
 
[*] Economista, edr2@netcabo.pt, www.eugeniorosa.com

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