O QUE ELES ESCONDEM

domingo, 29 de junho de 2014



SEM MAIS COMENTÁRIOS QUE OS DE UM "IRRESILIENTE"
 
 
   
Gabinete do Secretário de Estado da Cultura

Despacho n.º 5459/2013

1 — Ao abrigo do disposto no n.° 2 do artigo 3.°, nos n°s 1, 2, 3 do

artigo 11.° e do artigo 12.° do Decreto -Lei n.° 11/2012, de 20 de janeiro,

designo para exercer as funções de apoio auxiliar do meu Gabinete Ana

Margarida Soares Heitor de Bellegarde Machado.

2 — Para efeitos do disposto no artigo 12.° a nota curricular da designada

é publicada em anexo ao presente despacho que produz efeitos

desde 1 de abril de 2013.

3 — Publique -se no Diário da República e promova -se a respectiva

publicitação na página electrónica do Governo.

12 de abril de 2013. — O Secretário de Estado da Cultura, Jorge

Barreto Xavier.

 

Nota Curricular

Dados Pessoais:

Nome: Margarida Soares Heitor de Bellegarde Machado Data de

Nascimento: 17 de junho de 1983

Habilitações Académicas: Licenciatura em Prótese Dentária na Escola

Superior de Saúde Egas Moniz

Experiência Profissional:

Exerceu funções de apoio de Secretariado ao Secretário de Estado

da Cultura, nomeadamente, na organização da agenda, tratamento do

correio eletrônico institucional, organização de reuniões, atendimento

personalizado para o membro do governo, e organização e resposta dos

convites recebidos, entre junho e outubro de 2012; Exerceu funções

de recepção e acompanhamento dos visitantes bem como no apoio à

organização e protocolo de eventos oficiais nos gabinetes de apoio dos

membros do Governo da área da Cultura, entre 2010 a Junho de 2012,

designadamente:

- 14/06/2012 “Grande Orquestra de Verão” — Pátio do Palácio Nacional

da Ajuda;

- 19/06/2011 Concerto em Memória de José Saramago “As Sete

Ultimas Palavras de Cristo na Cruz”;

- 17/04/2011 Cerimónia de Entrega dos Prémios AICA/MC 2010 à

Artista Plástica Lourdes Castro e ao Arq. Francisco Castro Rodrigues;

- 12/04/2011 Assinatura de Protocolo entre o MC e a UMP, Projeto de

Voluntariado Cultural “Vi(r) Ver o Património das Misericórdias”;

- 04/03/2011 Sessão de Lançamento do Projeto de Levantamento de

Processos da Administração Central do Estado no contexto da Modernização

administrativa/ Macro Estrutura Funcional;

- 15/02/2011 Apresentação pública da Rede Portuguesa de Teatros

Municipais e do Fundo Para a Internacionalização da Cultura Portuguesa,

seguida da Assinatura do Protocolo de constituição da Portugal Music

Export, entre MQSPA e DGA/ Entrega da medalha de Mérito Cultural

ao Maestro Pedro Osório;

- 12/01/2011 Cerimónia de Apresentação do Protocolo entre o Ministério

da Cultura e a Associação Portuguesa de Galerias de Arte;

- 24/11/2010 ARTE LISBOA 2010 -Feira de Arte Contemporânea;

- 20/11/2010 Almoço das Primeiras -Damas dos chefes de Estado e

de Governo presentes na cimeira da NATO;

- 14/09/2010 Seminário sobre Gestão Cultural por Michael Kaiser;

- 28/07/2010 Reunião do Plenário do Conselho Nacional de Cultura;

Exerceu funções de gestão de recursos humanos e contabilidade de

clínicas dentárias, na Medifides — Prestação de Serviços Médicos e

médicos Dentários, Lda., entre 2007 e 2011; Exerceu funções de monitora

da componente de Apoio à Família, através do desenvolvimento

de atividades culturais e educativas para um grupo de crianças dos 6

aos 10 anos, numa escola de um bairro social da Junta de Freguesia do

Beato, entre 2007 e 2011;

Exerceu funções de Secretariado da Conferência sobre Ajuda Humanitária,

em 2007; Exerceu funções de técnica de prótese dentária

entre 2006 e 2007; Participação na organização de eventos no Cinema

São Jorge.

 ****
Ainda há quem diga que a nossa inteligência é igual à doutros.
Dêem-me segundo exemplo de previsão tão fina e passo a considerar-me normal como qualquer cidadão do mundo.
O sempre inexistente ministério da cultura, a compensar orçamento e secretário minúsculos, contratou uma técnica para arrumar cadeiras e guiar requerentes que porventura surgiam.
E adivinhem, se possível, a especialização da dita.
Nada mais nada menos do que prótese dentária, com diploma, provavelmente, da oficina da esquina.
Prevenindo-se, pois, contra as cáries da fome e fatal ranger de dentes, dotou-se a tutela de quem saiba o modo de tratar-nos da saúde.
Felizmente mulher, que a macieza é outra.
A.S.A., do blogue Irresiliências



sábado, 28 de junho de 2014


UNIÃO EUROPEIA: UMA NOVA COLONIZAÇÃO (I)

Por Héctor Illueca e Adoración Guamán*

A crise económica que afecta o nosso país e as políticas de austeridade impostas pela troika (Comissão Europeia, Banco Central Europeu e Fundo Monetário Internacional) estão a provocar uma fractura social cada vez mais evidente. Os cidadãos observam, atónitos, a degradação da vida quotidiana e a tolerância do poder para com os abusos cometidos pelos mais privilegiados do país. Como não podia ser de outra forma, a crescente deterioração das condições materiais de uma cada vez mais ampla maioria social chega acompanhada de gravíssimos escândalos de corrupção, que salpicam o conjunto das elites políticas e económicas, gerando uma sociedade cada vez mais instalada na injustiça e na desigualdade.
Neste contexto, o sonho da integração europeia tornou-se um pesadelo, que impõe um duro presente e nos condena a um futuro sombrio. De forma intencional, ofereceu-se aos cidadãos uma imagem falsa, ideológica e idílica da hoje chamada União Europeia, utilizando os meios de comunicação para projectar uma visão mítica e arredada da realidade: uma União Europeia completamente alheia aos princípios de coesão e colaboração solidários, que se converteu numa espécie de reserva de caça alemã, em que as economias fortes exploram as suas vantagens económicas e comerciais, para esmagar as débeis. Uma União Europeia governada pela lei da selva.

Contudo, a gravidade da situação económica e a queda da máscara do bem-estar individual fazem com que comece a abrir caminho, entre os habitantes da periferia, a ideia de serem vítimas de uma nova colonização. É cada vez mais difícil ocultar que a instauração do euro gerou uma relação centro-periferia, no seio da União Europeia, que enfrenta o Norte central e dominante com o Sul periférico e dominado. Já não é possível negar que a existência da moeda única beneficiou a Alemanha e outros países ricos da Europa, reforçando a sua posição, no esquema europeu, como exportadores líquidos de bens de equipamento e de consumo e como importadores líquidos da procura geral. Dizendo claramente e em poucas palavras: a união económica e monetária permitiu que os países centrais, especialmente a Alemanha, acumulassem excedentes comerciais crescentes, no seu espaço vital europeu, bloqueando qualquer possibilidade de desvalorização competitiva e alimentando uma intensa redistribuição do trabalho, em prejuízo das modestas economias da bacia mediterrânica. Os países fortes do centro, como a Alemanha, Holanda ou Finlândia, aumentam a sua competitividade, conservam a sua soberania nacional e financiam os seus Estados de bem-estar, graças à perda de competitividade, à destruição da soberania e ao desmantelamento do bem-estar dos seus companheiros de moeda – a periferia europeia.
Os trabalhadores do Estado espanhol, juntamente com os das restantes economias periféricas, converteram-se numa reserva de mão-de-obra low cost. Como assinalaram já alguns autores, o processo de construção europeia gerou uma nova divisão internacional do trabalho, alimentando uma dinâmica colonialista, caracterizada pela hegemonia alemã e pela subordinação das economias periféricas (1). É isto que explica que as actuações estatais de controle sobre o mercado e de protecção dos direitos sociais estejam sendo destruídas, ao ritmo dos ditames da união económica e monetária. Quando as exigências do processo entram em contradição com as disposições estatais em matéria de política social, os Estados periféricos procedem à adaptação dos seus respectivos sistemas de bem-estar, sempre no sentido de reduzir a protecção dos direitos laborais e sociais. O dumping social não só não foi combatido, como foi fomentado, fazendo da regulação do factor trabalho um elemento de competitividade e desencadeando um feroz darwinismo normativo, para reduzir os níveis de protecção laboral e social.

A nova divisão europeia do trabalho explica e promove a progressiva destruição dos modelos sociais estatais, auspiciada pela troika e imediatamente perceptível em dois âmbitos fundamentais: a flexibilização dos mercados de trabalho (em concreto, através da degradação da estabilidade no emprego e da desvalorização do custo da mão-de-obra) e a redução da protecção social, em particular dos sistemas de segurança social (redução das pensões de reforma, cortes na Saúde, etc). A sua influência vê-se, igualmente, na reforma educativa do Ministro Wert, também auspiciada pelas instituições europeias, que orienta o sistema educativo para a preparação de mão-de-obra barata, provida dos conhecimentos indispensáveis para responder adequadamente no mercado laboral lixo, que caracteriza os países subdesenvolvidos. A posição dependente e periférica da nossa economia , no esquema europeu, é radicalmente incompatível com a existência de pensões públicas, educação e saúde públicas e um mercado laboral medianamente digno.
Ao aceitar os diktat da troika, as classes dirigentes dos países periféricos assumem a sua incapacidade em encarar um caminho independente para os seus países e pactam uma relação de subordinação e dependência, semelhante à que se produz num processo de colonização clássico, caracterizado pela espoliação sistemática das economias periféricas e pela sobreexploração dos seus trabalhadores. Não devemos esquecer que são as classes dirigentes dos diferentes Estados membros que construíram e aprofundaram este modelo de União Europeia e, sob a sua intocável legitimidade, escudaram-se as mais impopulares e duras reformas. A possibilidade de minar a posição negociadora dos sindicatos alentou a conivência traidora das elites dos países deficitários, alimentando uma aliança sólida e estável com a burguesia alemã, para impor uma nova ordem político-social à escala europeia.

Neste contexto, não deixa de surpreender que determinados sectores da esquerda espanhola e europeia insistam em reformar a eurozona como solução para a actual situação de emergência social e económica. Com certo ar panglossiano, invocando a necessidade de “mais Europa”, criticam a fragmentação da política fiscal e denunciam a actuação de um BCE, disposto a proporcionar abundante liquidez aos bancos, enquanto abandona os Estados endividados, que suportam os ataques especulativos. Como proposta política, reclamam a abolição do Pacto de Estabilidade, a criação de uma autoridade orçamental e a modificação dos estatutos do BCE, para que possa conceder empréstimos aos Estados que atravessam dificuldades. Num arrebato de ingenuidade, chegam, inclusive, a falar de um “euro bom”, com o qual poderia estabelecer-se um salário mínimo europeu, para reduzir os diferenciais de competitividade entre os países.
Trata-se de uma quimera, que paralisou, durante décadas, boa parte da esquerda e do movimento sindical e que bloqueia a construção de uma alternativa, ao serviço das classes populares do nosso país. A zona euro carece de um Estado único europeu e não há nenhuma expectativa de que possa ser criado, num futuro próximo. A unificação da política orçamental suporia uma completa reestruturação da soberania, em toda a União Europeia, construída a partir de uma rigorosa hierarquia de Estados e de um cuidadoso cálculo de interesses nacionais, e necessitaria de um consenso, que não vai acontecer. Qualquer reforma possível iria respeitar a hierarquia de poder existente, caracterizada pelo domínio dos países da zona central e muito especialmente da Alemanha. Para expressar esta ideia com maior precisão: o euro foi o meio utilizado para forjar a hegemonia do capital alemão, que se impõe, inexoravelmente, no cenário europeu e impede a possibilidade de realização de um programa que responda às necessidades das maiorias sociais.

Na nossa opinião, qualquer agenda política que pretenda romper, realmente, com o neoliberalismo, mesmo num sentido reformista, deve encarar seriamente a saída do euro e enfrentar-se à União Europeia como tal. Como refere Costas Lapavitsas (2), a única saída progressista para o nosso povo consiste em abandonar a zona euro e recuperar o controle da soberania, no quadro de uma transferência radical do poder económico e social para o Trabalho. Uma estratégia que começa com o não pagamento da dívida soberana e se amplia com uma saída do euro, que permita ao nosso país escapar do cataclismo da desvalorização interna, imposta pela União Europeia. O nosso país tem futuro, mas um futuro digno passa, necessariamente, por romper com esta Europa e com as instituições desta Europa.
_____________
(1) NAPOLEONI, L. Democracia en venta. Cómo la crisis económica ha derrotado la política. Barcelona, Paidós, 2013.
(2) LAPAVITSAS, C. Crisis en la eurozona. Madrid, Capitán Swing, 2013.

 

UNIÃO EUROPEIA: UMA NOVA COLONIZAÇÃO (II)

A União Europeia foi construída à força de falácias. Desde a sua criação, com a Comunidade Económica Europeia, em 1961, a defesa da paz e da liberdade apareceram como objectivos idealizados, num espaço supranacional, aparentemente baseado em relações de igualdade e solidariedade entre os povos europeus. Este ideal actuou como poderoso engodo para os cidadãos do sul da Europa, muito especialmente para os espanhóis, portugueses ou gregos, que saíam das suas ditaduras com ânsia de entrar no que parecia o clube da democracia e da prosperidade. Para esta idealização contribuiu, de forma notável, o propagandeado crescimento económico que, no âmbito da antiga UE a 15, se produziu (mais em benefício de uns que de outros), durante quase duas décadas e que dotou de legitimidade e de um atractivo inegável o projecto europeu.
Contudo, cedo se demonstrou que aquele “clube” não era garantia nem de democracia, nem de prosperidade, mas uma armadilha para inibir a primeira e arrumar de vez a segunda. Na realidade, e como vimos num texto anterior, a armadilha europeia encobria uma nova colonização, baseada em relações de força e caracterizada pelo domínio dos países do norte europeu, fundamentalmente da Alemanha. O Tratado de Maastricht e o aparecimento do euro desencadearam uma guerra comercial, que devastou as economias dos países periféricos e está a caminho de fazer o mesmo com os sistemas políticos, destruindo a soberania e desmantelando o bem-estar dos Estados que se encontram em dificuldades. Cedo se evidenciou que aquela prosperidade derivava de um prévio e continuado desenvolvimento económico e social, conseguido a nível nacional por Estados configurados no constitucionalismo social do pós-guerra, com dinâmicas intervencionistas e políticas redistributivas, que a união económica e monetária eliminou por completo. Trata-se, nas palavras de Emmanuel Todd, da negação da Europa.

Neste contexto, considera-se imprescindível ultrapassar as margens impostas e atrevermo-nos a encarar a ruptura com as limitações que impedem o avanço de um programa, realizável, de transformação social. Na nossa opinião, a saída do euro constitui uma alternativa necessária, para recuperar a soberania e superar a gravíssima crise que atravessamos. Tratar-se-ia, juntamente com a negação a pagar a dívida ilegítima, do primeiro passo de uma estratégia constituinte, que pretenda o reequilíbrio da economia, no quadro de uma deslocação do poder económico e social para o Trabalho, situando o Estado no posto de comando da economia.
A estratégia tem numerosos e diferentes escalões. De início, é previsível que a desvalorização monetária provoque um aumento da dívida externa, já que teria de liquidar-se numa moeda muito mais valiosa que a nossa e seria impossível continuar a satisfazê-la. No que respeita à dívida pública (à volta de 300.000 milhões de euros) parece ineludível a suspensão dos pagamentos e a realização de uma auditoria pública, para assegurar um corte substancial, que aligeire o peso esmagador da dívida sobre a nossa economia. Consideramos, em particular, que deveria declarar-se ilegítima a contraída pelo Estado para a reestruturação e resgate do sistema financeiro, que implicou uma obscena socialização das perdas acumuladas pela banca, no financiamento das bolhas imobiliárias e da Bolsa.

No que diz respeito à dívida privada, os bancos estariam sob pressão e teriam que enfrentar falências. As tensões que o sector financeiro experimentaria tornariam indispensável a sua nacionalização e a criação de uma banca pública, com o fim de garantir os depósitos e assegurar um financiamento estável às pequenas e médias empresas. Além disso, e fundamentalmente, o controle público do crédito tornaria possível afrontar os desequilíbrios de fundo, que provocaram a crise, convertendo a banca pública num instrumento chave para reverter a financiarização da economia e transitar de um modelo dependente, baseado na especulação, para um modelo baseado na economia real, produtiva e industrial.
Paralelamente, o Estado deveria nacionalizar os sectores estratégicos (serviços públicos, transporte, energia e comunicações) e promover uma política de investimentos públicos que, tendo a protecção e defesa do meio ambiente como pilar fundamental, contribuísse para modificar e renovar a estrutura produtiva do país, travando os processos de desindustrialização e especialização produtiva, que derivam de uma inserção assimétrica na economia europeia. Como alguns autores destacaram, a crise económica está a provocar uma preocupante deterioração da nossa capacidade produtiva, motivada pela debilidade da actividade investidora, descapitalização do tecido industrial e desqualificação da força de trabalho, aprofundando a fractura produtiva, que separa o centro da periferia (1). Neste contexto, a reconversão do modelo produtivo torna-se uma tarefa urgente, sob pena de nos metermos numa rápida e dramática transição para o subdesenvolvimento. Em suma, trata-se de iniciar uma trajectória de crescimento diferente, caracterizada pela intervenção pública na economia, pela colaboração de um sistema bancário público e respeito pelo princípio de sustentabilidade ecológica.

Como corolário do que se disse atrás, a estratégia constituinte teria que abordar dois aspectos cruciais para deter e reverter a ofensiva neoliberal: uma reforma fiscal progressiva e uma profunda reestruturação do mercado de trabalho, como expressão de uma nova racionalidade económica, que sirva os interesses da maioria social. Com efeito, o alargamento da base tributável aos sectores mais poderosos e a perseguição à fraude fiscal permitiriam expandir a despesa pública e melhorar as prestações sociais, especialmente a Saúde e a Educação, que sofreram uma importante deterioração, como consequência dos cortes orçamentais. De igual modo, seria possível a reorganização do sistema de pensões, transferindo recursos do orçamento geral do Estado, para garantir a sustentabilidade do sistema e do poder aquisitivo das prestações (2).
No que diz respeito ao mercado de trabalho, é urgente uma resposta contundente e efectiva à emergência social, provocada pela situação de desemprego e precariedade generalizados, otorgando à legislação laboral um necessário protagonismo político. Antes de mais, enfrentamo-mos com a necessidade de desandar o caminho andado durante as duas últimas décadas, retomando a criação de emprego decente, como eixo nuclear da política económica. Neste sentido, as últimas reformas laborais, aprovadas pelo PSOE (2010-11) e PP (2012-13) devem ser expressamente derrogadas. As novas normas laborais deveriam incentivar a criação de emprego decente, estável e com salários dignos, melhorar as condições de trabalho, prestando uma atenção especial à igualdade efectiva entre mulheres e homens, à corresponsabilidade e à inserção laboral da juventude, assim como ao reforço da negociação colectiva. Partindo desta base, uma das estratégias para combater o desemprego, permitindo uma saída progressista e solidária à grave situação actual, é a redução do horário de trabalho, de forma generalizada, para facilitar a colocação dos trabalhadores desempregados. Esta medida estratégica deveria ser complementada com um aumento significativo do salário mínimo e com a extensão da protecção no desemprego, com o objectivo de contrariar os efeitos mais nocivos do ajustamento interno e dar início a um modelo diferente de distribuição da riqueza produzida pela sociedade.

Nos parágrafos anteriores, resumimos a estratégia que, em nossa opinião, permitiria superar a dinâmica colonial em que nos encontramos, depois da implantação do euro. É claro que o emprego do termo “constituinte” tem um significado preciso e congruente com o programa anteriormente esboçado: a chave está em impulsar um processo constituinte, para realizar uma transição democrática completa, que resolva as graves carências, arrastadas desde a ditadura e que reflicta um novo equilíbrio de forças entre classes e géneros. Não pode haver um reequilíbrio da economia a favor dos trabalhadores sem uma  profunda transformação do Estado numa direcção republicana, plurinacional e democrática, com pleno respeito pelo direito dos povos a decidir. Uma transformação que reflicta uma grande aliança político-social para substituir mecanismos de governo ineficientes e corruptos por transparência e participação popular permanentes. Esta aliança existe, de maneira potencial, na nossa sociedade e poderia materializar-se, se a esquerda política e social se aglutinasse, numa mudança radical, à volta de uma estratégia constituinte, que dispute a hegemonia à oligarquia.
________
[1] ÁLVAREZ PERALTA, I.; LUENGO ESCALONILLA, F. y UXÓ GONZÁLEZ, J. Fracturas y crisis en Europa. Madrid, Clave Intelectual, 2013.

[2] Ver, nesta linha de raciocínio, o documento “En defensa del sistema público de pensiones”, disponível em http://documentopensiones.org/
* Héctor Illueca, Doutor em Direito e Inspector do Trabalho e Segurança Social
  Adoración Guamán, Doutora em Direito e Professora de Direito do Trabalho  e  Segurança Social

Os originais destes textos encontram-se em:

segunda-feira, 23 de junho de 2014


A CONTRA-OFENSIVA DA DIREITA INTERNACIONAL

Por Emir Sader*

O novo ataque dos fundos abutres contra a Argentina forma parte de uma contra-ofensiva mais ampla da direita internacional contra os países progressistas da América Latina. Através dos seus principais porta-vozes nos mediaFinancial Times, Wall Street Journal, The Economist, El País – a direita ataca sistematicamente esses governos, que não aceitaram os ditames do Consenso de Washington(1). E, por isso mesmo, esses governos latino-americanos conseguiram evitar a recessão capitalista internacional, que se instalou, há mais de seis anos, no centro do próprio sistema, arrasando os direitos sociais e da qual ainda não se vislumbra o fim.
Os países latino-americanos que continuam a crescer e a distribuir riqueza, ao mesmo tempo que diminuem a desigualdade, que aumenta exponencialmente no centro do sistema, são um factor de perturbação, a prova concreta de que existe outra forma de fazer frente à crise, de que se pode distribuir riqueza, recuperar o papel activo do Estado, apoiar-se nos países do sul do mundo e resistir à crise.

Por isso dá-se a contra-ofensiva actual da direita, que procura demonstrar que já não há mais espaço para que a economia destes países continue a crescer; que os avanços nas políticas sociais não são nada disso e que a questão da dívida ainda não está resolvida. É crucial para as grandes potências tentar mostrar que não há alternativa ao Consenso de Washington.
A formidável arquitectura da renegociação da dívida argentina nunca foi assimilada pelas grandes potências. No caso de resultar, que mau exemplo para a Grécia, Portugal, Espanha, Egipto, Ucrânia e tantos outros países, presos nas armadilhas do FMI! Têm que demonstrar que os ditames da ditadura do capital especulativo são inquestionáveis.

A nova ofensiva contra a Argentina tem que ter resposta de todos os governos latino-americanos, que são, em diferentes níveis, igualmente vítimas do capital especulativo, esse que resiste a reciclar-se no investimento produtivo de que necessitamos. Está na hora de que os governos dos outros países da região não só acompanhem as missões argentinas, mas também assumam a intenção de cobrar impostos à livre circulação do capital financeiro. Uma medida indispensável, urgente, que só pode ser assumida por um conjunto de países, em coordenação.
Deste modo, o Brasil pode ajudar a Argentina – sugeriu-o, há pouco, um importante economista brasileiro – oferecendo-se como país intermediário do pagamento. A Argentina remetiria os recursos e o Brasil faria o pagamento aos credores legítimos, sem possibilidade de serem confiscados. Uma pequena ajuda que permitiria à Argentina pagar aos credores – 92% do total – que aceitaram os termos da renegociação.

Uma renegociação que, nos critérios vigentes em quase todos os países, determina que, quando dois terços ou três quartos das partes acordem os termos do resgate, os outros, automaticamente, têm de aceitar esses termos. É tempo de a América Latina formalizar esse critério.
Muitos países do mundo olham para a América Latina para entender como pôde livrar-se das suas dívidas externas. Esses mesmos países olham agora para a Argentina. Porque sabem que aqui está em jogo muito mais do que simplesmente o 8% da dívida remanescente. Está em jogo a soberania dos países, face àqueles que querem vergá-los ao peso das dívidas contraídas por governos que servem o FMI e os seus porta-vozes.

_________

* Professor universitário brasileiro, autor, entre outros, de El nuevo topo – Los caminos de la izquierda latino-americana, ed. El viejo Topo

Texto original em Publico.es
(1) O Consenso de Washington, entre o FMI, Banco Mundial, Banco Interamericano de Desenvolvimento e o Departamento do Tesouro norte-americano, consiste em 10 pontos:

1. Défice zero
2. Transferência da despesa pública social para “sectores que favoreçam o crescimento”.

3. Reforma fiscal, alargando a base de contribuintes e diminuindo as taxas de imposto. (Isto é, pôr os que têm rendimentos mínimos a pagar e reduzir o imposto a quem tem maiores rendimentos).
4. Desregulamentação financeira, com taxas de juro livre, de acordo com o mercado.

5. Taxa de câmbio da moeda mais competitiva.
6. Liberalização do comércio internacional, com diminuição das barreiras alfandegárias.

7.  Eliminação das barreiras aos investimentos estrangeiros directos.
8 .  Privatização das empresas públicas e dos monopólios estatais.

9 .  Desregulamentação dos mercados.
10.  Protecção da propriedade privada. (Não da pública)

Esta cartilha, inicialmente imposta aos países da América Latina, cujo primeiro e  bom aluno foi Pinochet, é aquela por onde os governos de Portugal, Grécia ou Espanha estão agora a ler, a mando da Alemanha. (N.T.)

sábado, 21 de junho de 2014


COSTA, RECEITA DE BILDERBERG

Segundo as regras do bipartidismo vigente – agora governas(-te) tu, que depois governo(-me) eu – caberá, em breve, a vez ao PS. Mas, como este partido não está muito seguro, há que dar-lhe uma mãozinha nova e limpar-lhe a fachada.
Os arquitectos da obra já escolheram, para capataz, António Costa, homem de confiança, a quem deram mesmo a honra de se sentar à mesa Bilderberg do patrão Balsemão.

As provas dadas como ministro de Guterres e Sócrates tornaram-se sólidas à frente da Câmara de Lisboa. Costa não desilude:
- Se, no governo Guterres, apoiou a maior fúria privatizadora até àquele momento, com a espoliação do nosso património que era a Cimpor, Soporcel, Setenave, Papel do Prado, Tabaqueira, Petroquímica, Quimigal, Gescartão e parte da Galp, Brisa, PT e EDP, e, no governo de Sócrates, continuou com a REN, EDP Renováveis e o resto da GALP (só não foi a TAP e os CTT, porque não houve tempo), na Câmara de Lisboa, vende ao Estado os terrenos do aeroporto, para que o governo possa privatizar a ANA; entrega aos privados a manutenção e conservação dos jardins públicos, através de uma concessão, que representa um encargo de 17 milhões de euros para a autarquia.

- Se, no governo de Sócrates, foi cúmplice do início da destruição do Sistema Nacional de Saúde, agora, na Câmara, continua a dar a sua ajuda, apoiando o encerramento dos Hospitais da Colina de Santana, para transformar esses espaços em hotéis e condomínios de luxo, reduzindo a oferta de cuidados de saúde à população, em geral, e expulsando os moradores da zona, que não poderão pagar os consequentes aumentos especulativos da habitação
- Se, nos governos em que foi ministro, esteve de acordo com as diferentes alterações ao Código do Trabalho, sempre no sentido de retirar direitos a quem trabalha, não é como presidente da Câmara que dá o dito por não dito, e, assim, transfere trabalhadores efectivos da Câmara para as Juntas de Freguesia,  contra a vontade destes, porque isso implicará perda de direitos adquiridos.

- Com a experiência feita como ex-ministro da Administração Interna, aprova, na Câmara, o encerramento de 11 esquadras em Lisboa, que o actual ministro quer ver concretizado.
Resta dizer que todas estas medidas, com Costa no governo ou na Câmara de Lisboa, têm sido aprovadas com os votos do PSD e CDS.

Não há dúvida, pois, que é o homem eleito.
Falta, apenas, do outro lado, arranjar um parceiro com quem possa dançar o tango, sem ser pisado. E esse poderá ser Rui Rio que, como o Expresso explicava, em 31 de Julho do ano passado, “António Costa e Rui Rio, dois amigos que se respeitam, com cumplicidades polítcas e pessoais várias, compondo um dueto que até esteve presente no Clube de Bilderberg”

E nós já sabemos, com Barroso, Lopes e Sócrates, que as escolhas de Balsemão são para levar a sério. 

 

 

 

 

 

 

Ninguém se interroga sobre a súbita pressa do enigmático Costa.
Ele, que ainda há pouco, acordara segurar o Seguro que, boçal e vendido, está a empurrar o PS para um minguamento previsível.

Repentinamente, o sô Costa larga o rosto inexpressivo que afivelara antes e jura, não pelo pai, que era uma excelente pessoa, mas pela mãe, estar disposto a arrostar qualquer fúria dos elementos e bater-se pela conquista da direcção do partido.
Ter-lhe-ão telefonado do Clube Bilderberg, onde a criatura esteve e mantém as amizades?

É que o momento está difícil, com o socialismo da mentira mais e mais desmascarado, chame-se PS ou UGT.
E as pessoas, sem verem opção mais cómoda, vão-se virando no sentido do PCP que, desde há muito, está clamando ser a soberania de um povo, o oposto do colaboracionismo.

Imagine-se que tragédia, na vida dos videirinhos, se se ouvisse cantar de novo, nesta Ibéria espezinhada, que vale mais morrer de pé do que viver (vegetar) de joelhos.
“Antes morir de pie que vivir de rodillas” - Pasionaria o disse.

A.S.A. (do blogue IRRESILIÊNCIAS)

sexta-feira, 20 de junho de 2014


PAZ E PÃO
Surgiu em Espanha uma nova formação política de esquerda, inspirada no movimento dos Indignados, que ocuparam, durantes meses, o centro de Madrid.

Chama-se Podemos e, em quatro meses, organizaram-se para concorrer às últimas eleições europeias, tendo obtido 1.245.948 votos (8%).
Durante a campanha eleitoral, os meios de comunicação espanhóis ignoraram-nos, contra toda a ética jornalística e democrática.

Depois dos resultados eleitorais e verificando que este movimento capta a simpatia de muita gente, estão a desencadear uma ofensiva contra o Podemos.
E, como Moscovo já não é o que era – uma referência para a luta e aspirações dos trabalhadores –, servem-se da Venezuela e outros países da América Latina, cujos governos, eleitos, se puseram do lado do povo e, por esse motivo, são odiados pelo poder deste “democrático” ocidente.

Assim, ontem, véspera da proclamação do novo rei de Espanha, o jornal El País que, nos últimos tempos, se tem mostrado ardente defensor da monarquia, dedicou página e meia, com chamada na 1ª página a uma coluna, a insinuar que o Podemos recebe dinheiro do estrangeiro, particularmente, da Venezuela (1).
A orquestração contra aquele movimento político verifica-se desde as emissões da rádio COPE, de ultra direita, ligada à igreja católica espanhola, até ao PP e PSOE.

Como Lenine dizia, “se o teu inimigo te elogiar, vê que erro cometeste”, nós deveríamos, segundo a mesma lógica, pensar que “ se o teu inimigo te atacar de forma violenta, estás no bom caminho”.
Esta é a nossa convicção.

A luta de Podemos poderá ficar pelo caminho, já que a direita controla todos os poderes, inclusive, os meios de comunicação (convém saber que o El País, considerado por muito boa gente como jornal de esquerda, teve como accionista, até à sua morte, o ex-ministro de Franco, Fraga Iribarne.)
Transcrevemos, a seguir, uma intervenção pública de Pablo Iglesias, um dos fundadores de Podemos. Pelo que diz e acima relatamos, parece-nos importante ouvir/ler o que pensa sobre a forma de luta a desenvolver.

Fica aqui o vídeo e o texto que, apesar de o som não nos permitr apanhar algumas palavras, percebe-se perfeitamente a sua mensagem.
____

(1) Alguns dos militantes do Podemos colaboraram no CEPS (Centro de Estudios Políticos y Sociales) como assessores especializados em Direito, Economia ou Ciências Políticas, a pedido de organizações e Estados da América Latina. Alguns elementos do PSOE e da IU colaboraram, igualmente, neste Centro de Estudos, que terminou as suas funções em 2012.

Vídeo:
http://www.youtube.com/watch?v=dtyYTmigjJg&feature=player_embedded

 (Transcrição):
 “Eu sei, eu sei que a chave para entender a História dos últimos 500 anos é a formação de umas categorias sociais, que se chamam classes. Claro que o sei. Vou contar-vos uma anedota, quando começou o 15 M. Na Puerta del Sol, alguns estudantes da minha Faculdade, Faculdade de (Ciências) Políticas, estudantes muito politizados, tinham lido Marx, tinham lido Lenine, participaram, pela 1ª vez na sua vida em assembleias com gente (?) e desesperavam-se. Diziam: “Claro, não entendem nada. Estamos-lhes dizendo: tu és um operário, embora não o saibas”. E as pessoas olhavam para eles como a extraterrestres e eles iam para casa muito tristes, porque diziam: “É que não entendem nadu podes ter o melhor diagnóstico, chegar a casa e compreender a chave do desenvolvimento político, desde o séc.XVI, e entender que o materialismo histórico é a chave para compreender o desenvolvimento dos processos sociais. Mas, o que vais fazer às pessoas é gritar-lhes: “Vocês são operários, embora não o saibam”?

(?) inimigo desejando rir-se de ti. Podes vestir uma camiseta com a foice e o martelo, podes, inclusive, arvorar uma bandeira enorme, de metros e metros e metros e metros e voltares para casa com a tua bandeira, enquanto o teu inimigo está a rir-se de ti, porque o povo, os trabalhadores preferem-no a ele, acreditam nele, entendem-no quando ele fala e não te entendem a ti e tu podes ter razão e pedir aos teus filhos que ponham, numa placa, na tua tumba, “ele sempre teve razão, embora ninguém o soubesse”. Mas quando estudas as experiências com êxito dos movimentos de transformação, das-te conta de que a chave do êxito é conseguir estabelecer uma certa identificação entre os diagnósticos e o que sente a maioria. Isso é muito difícil, isso implica cavalgar contradições.
Tu julgas que eu tenho algum problema ideológico – alguma greve de 48, 72, selvagem, nenhum. Mas os que a fzem não têm nada que ver com a vontade que tu ou eu tenhamos de a fazer, tem que ver com a força das organizações sindicais e aí, suspeito, que nem tu nem eu pintamos alguma coisa. Tu e eu podemos querer, podemos desejar que a Terra seja o paraíso, pátria da humanidade, podemos desejar o que quisermos e pintar na camiseta o que nos apetecer, mas a política tem a ver com a força, não com os desejos, nem com o que se diz numa assembleia.

Neste país só há dois sindicatos com capacidade para organizar uma greve geral e são CCOO e UGT, goste eu ou não, mas é o que existe. E fazer uma greve geral é muito difícil. Eu estive nos piquetes, em Cocheras, em Madrid, com gente que estava nos piquetes e, de manhã, quando amanhecia, sabes para onde eles tinham de ir? Para o trabalho. E não era(?) é que os punham na rua. No seu trabalho não havia organizações sindicais que os pudessem defender. Porque os trabalhadores que podem defender-se, como os dos estaleiros navais, como os mineiros, é porque têm sindicatos fortes. Mas, os moços que trabalham como teleoperadores ou na telepizza ou as moças que estão nas lojas não podem defender-se. Despedem-nos no dia seguinte e não vais estar tu, nem vou estar eu, nem nenhuma organização sindical que lhes garantize que pode sentar-se com o chefe e lhe diga; “é melhor para ti que não despeças esta pessoa por ter exercido o seu direito à greve porque, então, vai-te sair mais caro”. Mas isso não acontece, por muito estusiasmo. A política não é o que gostaríamos que fosse, é o que é e é terrível. Por isso há que falar de unidade popular, há que ser humilde, porque às vezes, há que falar com gente que não gosta da tua linguagem, que não se identifica com os termos com que tu explicas as coisas e isso o que revela? Uma derrota de muitos anos. É que perder, sempre implica isso. Perder sempre implica que o sentido comum geral das pessoas é diferente. Mas isso não é coisa nova. Isso era sabido pelos revolucionários de sempre. E a chave é conseguir que o sentido comum vá numa direcção de mudança. César Rendueles que é mais esperto que a fome, diz que a maior parte das pessoas está contra o capitalismo e não o sabe. A maioria das pessoas defende o feminismo sem ter lido (?) ou Simone de Beauvoir. Quando vês um pai a lavar os pratos ou a brincar com a filha ou quando vês um avô que está a ensinar ao seu neto que os briquedos se partilham, há aí mais de transformação social do que em todas as bandeiras vermelhas que tu queiras levar a uma manifestação. E, ou entendemos isso, que as coisas podem ou (?) ou continuarão a rir-se de nós.
O inimigo quer-nos assim, o inimigo quer-nos pequenos, com uma liguagem que ninguém entende, querem-nos minoritários, querem-nos refugiados nos nossos símblos de sempre. Estão encantados porque sabem que assim não representamos um perigo. Podemos ter um discurso muito radical e dizer “Queremos fazer uma greve selvagem, o povo em armas”, os símbolos mais fortes, um montão de (?), podemos levar retratos para a manifestação do grande líder revolucionário. Eles estão encantados, eles riem-se de nós. Agora, quando juntas centenas, milhares de pessoas, quando de repente o que estão a dizer convence a maioria, a isso chama-se fazer política e este é o principal ensinamento.

Havia um camarada que falava dos (?) em 1905, aquele careca, com uma mancha na cabeça que era uma mente prodigiosa, prodigiosa. O que entendeu foi a análise concreta da situação concreta, num momento de guerra em que o poder estava de rastos, na Rússia, e disse uma coisa super-simples, uma coisa muito simples a todos os russos, fossem soldados, fossem camponeses, fossem trabalhadores. Disse-lhes “paz e pão” e quando disse “paz e pão” que era o que toda a gente queria, que acabasse a guerra e pudesse comer, então um montão de russos que não tinha nenhuma ideia de se eram de esquerda ou de direita, que basicamente tinha fome, disse “Pois há-de ter razão, este careca”. E ao careca resultou-lhe muito bem, ao careca resultou-lhe muito bem. Não lhes disse “materialismo dialéctico” ao povo do seu país, disse-lhes “paz e pão” e essa é uma das principais lições do séc. XX.
Quando se pretende transformar as coisas, copiando a História, copiando os símbolos, o que se acaba fazendo, com todo o carinho, com todo o respeito, é o ridículo. Não vai vir nunca em nenhum país nenhuma experiência concreta para repeti-la sem mais nem menos. A chave é analisar os processos, analisar as lições das História e compreender que em cada momento o que significa “paz e pão.

Se isso não tem que ver com o que sente a maioria das pessoas, é uma reprodução em forma de farsa do que pôde ser uma vitória, trágica em certos momentos.”

 

quinta-feira, 19 de junho de 2014


 

EURO: INSTRUMENTO DE SUBMISSÃO À ALEMANHA E AO GRANDE CAPITAL
As últimas medidas do Banco Central Europeu (BCE) de baixar as taxas de juro para 0,15% e injectar, durante este ano, 400 mil milhões de euros, nos bancos privados para, segundo diz, facilitar o crédito às empresas e famílias, não resolverão o problema da recessão, como explicam Juan Torres López e Eduardo Garzón Espinosa, nos textos aqui publicados (“Mais dinheiro para a banca, inutilmente”, “É preocupante a baixa inflação na eurozona”).

A verdade é que o BCE está a reagir a uma deflação que se instala na zona euro e, muito particularmente, nos países sujeitos à prestimosa “ajuda” da troika, como se pode verificar neste quadro:

2014
Portugal
Espanha
Grécia
 
Janeiro
Fevereiro
Março
Abril
Maio
 
0,059%
0,083%
-0,366%
-0,141%
-0,438%
 
 
0,199%
-0,017%
-0,146%
0,368%
0,2%
 
-1,470%
-1,150%
-1,348%
-1,348%
-1,960%

Fonte: INE e  Global Rates
No dia 12 de Junho último, o jornal Público, por exemplo, noticiava que “a taxa de inflação em Portugal registou, pelo quarto mês consecutivo, um valor negativo, acentuando a queda de preços que está a aumentar os receios de que a economia caia numa situação de deflação” e que “a taxa de inflação homóloga em Maio foi de -0,4%” (em 2013, era de -0,1%).
No mesmo dia, os jornais espanhóis chamavam a atenção para o facto de Espanha apresentar, em nove meses consecutivos, uma inflação abaixo dos 0,5%.

Na realidade, o objectivo do BCE é travar a deflação, não a pensar na economia, mas 1) na estabilidade das taxas de câmbio do euro, a favor das grandes empresas, que precisam dessa estabilidade nos preços em transacções comerciais e financeiras, dentro do espaço comunitário; 2) em defesa de um euro forte nos mercados internacionais, beneficiando o capital financeiro europeu, sobretudo o alemão, que poderá continuar a exportar os excedentes, conseguidos à custa da dívida de países como Portugal, expandindo-se, através de fusões e aquisições, para outras partes do mundo e captando a riqueza dos investidores estrangeiros, que se convencerão a trocar a composição de divisas das suas carteiras a favor do euro (1).
Estas são e foram as intenções que presidiram à criação da moeda única e do Banco Central Europeu, erigido em defensor de um euro forte, ao serviço dos grandes negócios do capital financeiro europeu (o capital produtivo, mesmo o das grandes empresas, encontra-se totalmente submetido e/ou interligado ao capital financeiro).

Tal como uma inflação alta ou uma deflação, também o défice e a dívida pública fazem o euro perder valor. Daí a imposição, através do Tratado Orçamental, de um limite do défice de 0,5% e de 60% do BIP em dívida pública, com os consequentes cortes nos salários, pensões, saúde, educação, segurança social, assim como aumento de impostos sobre o consumo e o trabalho.
Estamos, portanto, amarrados (até querermos) a uma desvalorização interna, que significa empobrecimento e destruição da economia, para sustentar uma moeda forte (o euro vale o que valeria 1 marco alemão), de que a Alemanha se vai servindo para dominar o mercado interno comunitário e colocar no mercado internacional os excedentes de capital que, desta forma, está a acumular.

É preciso dizer que estas políticas têm sido aprovadas pelos diferentes governos (em Portugal, PS – PSD – CDS), que recusam fazer qualquer referendo sobre estas questões – adesão à moeda única, Tratado Orçamental, etc. – e apoiam um Banco Central Europeu, que “só responde perante Deus e a história”(2), porque:
- É “autónomo e independente”, dizem os seus estatutos. Mas, de quem?

- Está proibido de “solicitar ou aceitar instruções de organismos, instituições comunitárias ou governos dos Estados membros”, mas pode, como vemos, dar instruções e ordens aos governos
- Concede empréstimos aos bancos privados e nega-se a comprar dívida soberana, com os lucros agiotas para os primeiros e prejuizos colossais para os Estados.

- Põe e dispõe do dinheiro que é nosso, já que o capital do BCE é composto pelas contribuições que os bancos centrais nacionais dos países do euro (Banco de Portugal, no nosso caso) aí depositam.
- Tem como presidente um alto funcionário do banco Goldman Sachs e seu vice, o grande “socialista” Constâncio, que, como supervisor do BPN, BCP, etc, segundo as notícias, já deu sobejas provas, como Draghi, de quem acoberta e ao serviço de quem está.

_____
(1) Lapavitsas, C. Crisis en la eurozona, Madrid, Capitán Swing, 2013

(2) Martín Seco  J. F. Contra el euro, Península, 2013